quinta-feira, 10 de janeiro de 2019

Na Fazenda



O bezerro, que ainda não sabe e nem precisa respeitar as porteiras, vem feliz do passeio.
Nós, as vacas e os bois, entediados com nossos destinos, estranhamos a felicidade. Queremos saber de onde ele vem e o que lhe faz ter esses olhos de esperança.
Será que achou grama nova? Será que o rio está mais limpo, raso e fresco? Será que nasceram mais árvores? Será que as alfaces ou os patos viraram moda na mesa dos humanos? Será que o verão está no fim? Será que o inverno não virá? Será que a primavera terá menos pólen no ar? Será que o outono será mais verde?
O bezerro não sabe nada disso.
O que sabe, então?
Ele estava, como sempre, distraído, perto de onde estavam os humanos. Viu e ouviu alegrias.
Alegrias?

Sim, alegrias! E elas não eram por causa dos próprios humanos. As alegrias foram motivadas pelo rebanho.
O rebanho? Nós?
Sim, nós, o rebanho!
Pelo que o bezerro entendeu, estamos (nós, o rebanho) valorizados. Nossas qualidades passaram fronteiras. As ações até subiram e bateram recordes (isso ele apenas ouviu e repetiu sem saber explicar o que é ou como funciona). Será um novo tempo para os bovinos! Seremos donos do nosso destino (profetizou). Muitos de nós vibram.

Longe do tumulto, andando de um lado para ou outro (para se manter magro e vivo) o boi velho, pensativo, diz que é preciso cuidado quando os fazendeiros estão felizes. As alegrias dos fazendeiros nunca são boas para o rebanho.
Alguns entendem e concordam. Poucos repetem as palavras do mais sábio dos bois. Mas a maioria diz que ele está ultrapassado e só sabe torcer contra.

A maioria está feliz e esperançosa com as alegrias dos fazendeiros. Acreditam piamente que um novo destino está nascendo para os bovinos.
A poucos metros dali, as portas do matadouro recebem nova graxa e os ganchos são afiados.





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